O QUE É O MUSEU CORDEL DE MULHER?


Gabrielle Longobardi
e Lucélia Borges
O Museu Cordel de Mulher é um espaço que visa contribuir com a salvaguarda da memória das mulheres cordelistas e, de forma geral, com as pautas dessa luta que há muito empreendemos.
Este projeto nasceu e se concretizou durante meu percurso no Mestrado em Artes da Cena, na Escola Superior de Artes Célia Helena (em parceria com o Itaú Cultural – SP), dentro da linha de pesquisa 'Memória e acervo'. Foi nesse contexto que desenvolvi o trabalho "Museu Virtual Cordel de Mulher: Memória, Cordel e Artivismo”, que culminou na criação deste espaço virtual.
É sabido que historicamente as mulheres tiveram suas vozes silenciadas e apagadas da Literatura de Cordel, estando inicialmente presentes apenas nas temáticas (narradas pelos homens), que, diga-se de passagem, é o tema mais recorrente nos folhetos populares...
As abordagens traziam (e infelizmente, ainda trazem), em seu bojo, uma gama de valores ideológicos, que reproduzem ainda basicamente preconceitos machistas da sociedade, com uma visão da mulher inferiorizada, estigmatizada. Uma mulher apta apenas à maternidade e aos afazeres domésticos, sendo representada por vezes, como ingênua, como uma mãe perfeita, esposa fiel, e em alguns momentos astuta e impura, como solteirona despeitada, fogosa e sensível; e noutras, assexuada e interesseira.
A aparição de mulheres como autoras tarda a figurar nas publicações do gênero. Os registros datam para um maior volume nas décadas de 60 e 90. No entanto, a primeira obra de uma mulher cordelista que se tem notícia, teria surgido muito antes em 1938. A obra intitulada “O violino do diabo ou o valor da honestidade” é impressa com autoria de “Altino Alagoano”, o pseudônimo (nome do esposo) que fora utilizado pela paraibana Maria das Neves Baptispa Pimentel, considerada a primeira mulher cordelista a publicar um folheto.
Compreendendo esse cenário masculinizado e marcado pelo machismo estrutural que foi e ainda é o ambiente cordelístico, este site apresenta-se como uma estratégia de transformação e resistência desse universo, que felizmente, hoje conta com coletivos de mulheres muito atuantes, conforme poderá ser visto na pequena mostra que selecionamos.
Como nos museus orgânicos, que são instituições culturais com um enfoque participativo e comunitário, nós também envolvemos nesse espaço a comunidade de mulheres que produzem cordel, amplificando suas vozes e acessibilizando suas produções a um número ilimitado de visitantes que poderão conhecer suas obras e histórias. Vislumbramos esta iniciativa como um embrião, um sopro inicial na transformação que queremos ver no cordel.
Intentamos que esse espaço funcione como um lugar de valorização e reconhecimento, onde o saber das mulheres — com toda sua profundidade, criatividade e relevância — seja reconhecido como uma contribuição legítima ao nosso patrimônio cultural. Essa iniciativa não se limita a exibir o que já foi produzido; ela também celebra a rica diversidade de perspectivas e experiências femininas no cordel, que historicamente foram subvalorizadas ou invisibilizadas.
Se no passado, para garantir a preservação de seus escritos, essas mulheres tiveram que recorrer a estratégias como armazenar textos em cadernos, guardá-los em baús ou até escrever sob pseudônimos e heterônimos, que agora — neste presente que construímos em cada uma de nossas ações — seus versos possam ultrapassar fronteiras e alcançar o mundo. Que suas palavras sejam livres, inspirando e empoderando outras mulheres que ainda enfrentam barreiras e se sentem oprimidas.
Bem-vindos ao Museu Cordel de Mulher!
Julie Oliveira
Cordelista e Fundadora do Cordel de Mulher

Lucélia Borges
